DENGUE - A CAVALARIA AINDA NÃO CHEGOU...

A falta de métodos efetivos para interromper a transmissão do dengue, como por exemplo, a existência de uma vacina, tem imputado a população em geral e aos governos em particular um preço muito alto, em vidas e em dinheiro público.

O dengue é uma doença sazonal e endêmica com períodos epidêmicos. Embora não sejam conhecidos claramente os fatores que determinam a elevação do número de casos, as epidemias vêm atingindo um número cada vez maior de cidades, com  ocorrência de casos mais graves, principalmente, entre as crianças, antes menos afetadas.

A mudança do padrão de severidade e as limitações do controle da doença vêm demandando um planejamento da área da assistência médica, não só em manejo clínico da doença, mas principalmente em gerenciamento de crise. Historicamente o dengue era uma doença que sobrecarregava a rede básica, mas em 2008,  esta tendência mudou a ponto de alterar a série histórica da proporção de casos internados na cidade do Rio de Janeiro.

Os anos que precedem os picos epidêmicos são marcados por aumento gradual  do número de casos no segundo semestre, semelhante a formação de uma onda. Uma epidemia se forma quando, ao acaso ou transportado por algum meio, um vírus epidêmico e mais agressivo emerge. As alterações dos padrões de incidência são atribuídas a um comportamento natural de uma doença viral, que não tem nenhum mecanismo de controle efetivo e não necessariamente,  a um fracasso das políticas municipais de controle do vetor. Nada pode deter a emergência de um vírus epidêmico.

Os anos que se seguem às grandes epidemias costumam cursar com diminuição acentuada do número de casos, explicado parcialmente por um esgotamento de susceptíveis e equivocadamente atribuída a um sucesso de alguma estratégia governamental colocada em prática durante a epidemia. Depois toda imprensa publica que o número de casos reduziram e todos comemoram.
A verdade é que a variação percentual do número de casos é uma medida que demonstra  o movimento da doença até a próxima onda se formar.

A propaganda do Ministério da Saúde anunciando a diminuição de 46% do número de casos no Brasil e o sucesso da estratégia “Todos Unidos Conta a Dengue” parece precipitada. A avaliação se baseia na comparação entre o número de casos ocorridos no primeiro semestre de 2008 com o mesmo período em 2009 no qual, o peso da epidemia de 2008 ocorrida no Rio é muito grande e uma redução de mais de 90% neste mesmo período influencia os números no Brasil.
Este mesmo comportamento foi observado nos anos de 2002 e 2003, o que descarta a possibilidade de se atribuir  esta diminuição à troca de governo municipal.

A pergunta que deve ser feita é: Esta diminuição do número de casos no Rio de Janeiro ou no Brasil pode ser atribuída às novas estratégias adotadas na cidade ou no país?

Tudo leva a crer que não, sem desmerecimento de qualquer iniciativa, mas no mesmo ano em que o Ministério da Saúde comemora a diminuição percentual do número de casos, a mídia regional denuncia aumento de casos no Mato Grosso do Sul, na Bahia, no Ceará e em inúmeras cidades de médio e pequeno porte, sem capacidade de influenciar os números nacionais como o Rio de Janeiro, demonstrando uma rápida capacidade de interiorização da doença.

No ano de 2009 as mídias locais reportaram aumento de transmissão até mesmo em cidades que são modelos para o Programa Nacional de Controle do Dengue (PNCD-MS), como Belo Horizonte em Minas Gerais.

A discussão sobre qual é a estratégia ideal para se eliminar o mosquito transmissor tem sido grande, muitas inovações tem surgido, porém considerando a velocidade com que a doença tem atingido os centros urbanos no Brasil, a incapacidade geral de sustentação de resultados “positivos”, e as perguntas sem respostas que temos acumulado mostra que ainda estamos distantes da solução.

O levantamento do índice de infestação larvário medido por amostragem (LIRA), com todas as suas limitações, tem o mérito de avaliar o resultado dos esforços na eliminação de mosquitos, mas não tem apresentado evidências de ter uma relação direta com o aumento do número de casos. Na cidade  do Rio de Janeiro, os anos com índices de infestação mais elevados, como o de 2005  coincidiram com as menores incidências da doença e,  os com menores índices com a epidemia de 2008.

A diminuição gradual destes índices coincidiu na prática, com a aplicação da estratégia de manejo integrado objetivando a eliminação de criadouros com maior potencial de produção de mosquitos (macrofocos). O que indica que não existe melhor estratégia, mas sim a mais adequada considerando a diversidade do espaço urbano, a região do país e nunca esquecendo que todas são limitadas.  
 
Neste cenário, as estratégias de controle mais bem sucedidas parecem ser todas aquelas que valorizam a integração das ações e o uso da inteligência epidemiológica, aplicadas tanto à rotina como durante os momentos epidêmicos, porque em se tratando de prevenção da doença, ainda estamos esperando pela “Cavalaria”.                            

(autora: Cecília Nicolai  cecilia.nicolai@gmail.com, @cecilianicolai)










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